quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Centésima-quinquagésima noite - Sejamos,

Vulgares e espalhafatosos sejamos, Antônio Marlos, e não haverá roupas intimas mais frágeis, mais vagabundas, mais sujas que aquelas que rasgarei na tua frente antes de separar minhas coxas em ângulo o mais obtuso, uma em Irauçuba outra em Sebastopol, como preparação ao sorvete misturado com gin de três réis a dúzia com o qual você me cobrirá e limpará com a língua.

Exagerados e gargalhentos nos tornemos, Antônio Marlos, e absorverei metade da produção do dia das fábricas de silicone, e no meio dos dois galhardos morros que se erguerão a teu olhar poderei ver sua camisa colorida-cafajeste de peixinhos, o peito tornado floresta amazônica e o jeans apertadíssimo a marcar cada relevo.

Incorretos e descensurados nos transformemos, Antônio Marlos, você se orgulhará de cada um dos muitos centímetros, e eu te direi que és o primeiro, e quando descobrires que não o és, eu te direi que és muito mais – o melhor.

Nós mesmos sejamos, Antônio Marlos, ou não o sejamos – transformando-nos em nós pelo avesso, em perfeita decência – a suprema e única decência de se ser o que se é.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Centésima-quadragésima-nona noite - Um Momento e não mais

Conto a história de Kédira – e Kédira podia ser mercadora de pérolas, corretora de imóveis ou aquela tua tia-bisavó que a história oficial da família deletou por indecência.

Conto a história de Elêusis – de quem se alegaria ser escravo do Épiro, soldado da fortuna ou alpinista radical em alguma cresta de monte no Oriente Extremo.

Kédira leria os tratados de Euclides e as versões menos censuradas do Cântico dos Cânticos, e descobriria que as paralelas encontram-se no âmago do infinito e no seu próprio corpo.

Elêusis iria de’cor´ar os nomes das seiscentos e sessenta concubinas do Rei Salomão, e a cada uma delas conferiria o titulo de nova Lady, Chatterley ou Godiva, dentro do supremo poder que a fantasia confere.

Encontraram-se apenas por uma vez, em um quarto com pouca luminosidade, um cobertor de penas, e não interessa saber mais detalhes.

E Kédira, que podia ser muitas, cravou suas unhas nas costas de Elêusis, que enterrou o rosto nos cabelos de Kédira que recendiam a algum sândalo antigo do Oriente ou perfume top – a pele morena na pele branca, e pouco importa saber o que pertencia a quem.

Não quiseram saber detalhes um do outro, e nem eu e você devemos querê-lo.

Louvemos a Kédira e Elêusis, que souberam ser mulher e homem, durante um instante – e é inútil sê-lo mais.