domingo, 19 de junho de 2016

Centésima-vigésima-quinta noite – A carta erótica

No dia 19 de junho de 1938 [exatamente às vinte e três horas e cinquenta e sete minutos] Erich Maria Remarque tomou da caneta-tinteiro Parker 17, quatorze folhas de papel de carta impressas com seu monograma e escreveu uma carta para Marlene Dietrich.

[Que ninguém se preocupe com problemas de orçamento – depois de vender um milhão de exemplares de Nada de Novo na Frente Ocidental, o escritor não tinha problemas de orçamento].

Esqueceu as bombas e os ataques de gás – e não foi nenhum deles que o acordou naquela tépida praia na República Dominicana. Por aquela noite, os nazistas que o perseguiam e queimaram seus livros deixaram de existir. O veterano de guerra ]e denunciador dos horrores da mesma] voltou-se [pela vez primeira e talvez única] para a bela [e talvez única] realidade da vida – voltou-se para o Amor.

E encontrou-o em sua conterrânea Marlene Dietrich – um amor anguloso, duro, o oposto da melosidade hollywoodiana.

E [ele mesmo re-tornado adolescente] escreveu [com a escrita crua e detalhada que o fez rico e famoso] o que intencionava fazer com ela – desde as investidas em que sua cabeça pareceria atravessar-lhe o útero e reaparecer pela garganta, até a posição em que ele procuraria novos caminhos por dentro dela [ela de costas a dar gritos de partir cristais] até o encerramento com muito mel – um mel alvo que a alimentaria com gozo.

Escreveu – e guardou na gaveta. Tomou outro maço de papéis e rabiscou alguma banalidade sobre como tinha saudades dela, e esta colocou no correio.

De alguma forma a carta sincera apareceu na primeira edição da coletânea de cartas entre eles (edições Kiwi, Colônia, 2003), e depois foi retirada.

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