quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Centésima-quadragésima-primeira noite – Persegui Manoela Teresa

Durante setecentos e dezessete dias e três horas e meia dúzia de segundos persegui Manoela Teresa. Trouxe-lhe flores, fui cavalheiro, abri mais portas que qualquer concierge do Hotel Mediterranée, multipliquei bilhetes com versos tirados do Google e mandei cartões até no aniversário do seu canário belga, e Manoela Teresa não ocasionou nenhum clac a desfazer o fecho da cinta-liga vermelhona.

Levei-a bares de beira de morro, shows safadões com algum Wesley, puxei-a a dançar em funks que repetem continuamente as mesmas cinco palavras [das quais três com erros de ortografia], chamei-a de tchutchuca, vestia-a com boné de aba para trás, fizemos coreografias diante das quais Michael Jackson era um clássico em bailes improvisados ao lado de paredões cercados de isopores com vodca de preço a rastejar ao chão de tão barata, e Manoela Teresa me deu beijinhos de boca fechada e me desejou boa noite ao bocejar.

Pus óculos parecidos com os de Sartre, comprei edição francesa das Flores da Mal, contei-lhe a história de Remarque ou das lendas de algum cantão suíço, discuti com ela a distinção entre Verdade e Realidade à luz da filosofia analítica, e Manoela Teresa não me mostrou a coleção de calcinhas.

E então voltei-me a ir embora, para meditar minhas mágoas em alguma montanha próxima a Katmandu ou ir para casa.

E Manoela Teresa me puxou, convenceu-me a contemplar a paisagem pela sua janela. E contemplei o por do sol fosco sobre o corpo de Manoela Teresa, que dava gritinhos.

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