Ela [deitada por inteiro de bruços sobre os fofos
cobertores] recitava em duas línguas um velho poema de Hans Magnus
Enzensberger [Nebenan spielt ein Kind Pour Elise/ Por perto um
menino tocava o Pour Elise] – e por [ou não] coincidência ela
também se chamava Elisa.
Elisa deitada por inteiro sobre os fofos cobertores e eu
deitado por inteiro sobre Elisa – Goethe e duas biografias de
Elisabeth da Baviera sobre a prateleira. Moderninhos que somos, o
telão da Internet ligado na livecam nos enchia os olhos com
uma Berlim fosca, o Portão de Brandenburgo calafetado de turistas
que desconheciam que Brandenburgo não é uma pessoa.
Hans Magnus cedeu o passo a um par de estrofes de
Heinrich Heine e Elisa poderia contar as estocadas – de tão
sentidas[Elisa de olhos fechados não via o passeio da câmera pela
Avenida Sob as Tílias [a catedral quase negra como aparição ao
fundo] e eu [talvez levado pelo inevitável romantismo do nome da
rua] apliquei-lhe quatro, seguidas, rápidas, a tentar atingir a alma
de Elisa [ e se não conseguisse, pelo menos que lhe chegassem à
garganta].
Elisa deixou a alta cultura, a cantar alguma baladinha
boba do Luttenberger Klug [Quero atravessar com você esse super
verão] e eu [inspirado ou não pela mudança] também realizei
outra, terminando a visita e começando outra, mas não pela mesma
porta desta mansão, uma doce porta por trás desta mansão
brasileiro-teutônica que é o corpo de Elisa. Elisa me olhou, fechou
os olhos, deu um gritinho a parecer ária de Wagner.
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