Gilberte, não te conheço. Mas se te
conhecesse [minha francesíssima Gilberte] eu seria Marcel [francês também, como
já devidamente estabelecido acima]. Passearíamos ao luar [ou ao sol, melhor]
depois da missa de domingo em algum caminho florido [tela de Renoir ou Monet]
de certo senhor chamado [talvez] Swann, 1907 ou 8 no cabeçalho do jornal.
Adentraríamos um caminho de choupos
[pois todo passeio paradisíaco Europa-de-antigamente tem choupos, e eu nem sei
o que é isso] – tu com teu vestido de tantas frufrus e rendas que eu nem
saberia onde estou, e eu a gravata meio-fraque a me estrangular.
À beira de um tranquilo lago [e como
nos pôsteres há tranquilos lagos] tu me falarias de tua mãe Odette,
a smart, e como ela falava inglês numa época em que quase ninguém. E eu te
contaria três anedotas cuidadosamente selecionadas sobre a minha tia Leonie,
que nunca sai da janela e conhece metade e meia da cidade. [Também não há muito
a quem conhecer nesta cidade de Combray, que desconhece talvez a própria
existência].
Isso, se fôssemos aquele Marcel e
aquela Gilberte de Proust. Mas não o somos – e eu [não Marcel mas eu] usaria
essa toalha de piquenique para forrar aquele gramado europeu [minha falsa
Gilberte] e tu praticarias a nobre arte do hipismo [os frufrus e as sedas
amontoados de lado] e poderíamos até contemplar o ápice do Monte Branco. Se
estivéssemos de olhos abertos, minha brasileiríssima Gilberte [a qual conheço].