A mais bela
pintura de Cândido Portinari nunca foi intentada, e se o foi, perdeu-se há
décadas.
De fato
conta a história [e talvez não minta] que o mestre um dia viu [pela infinitésima-segunda
vez] o mundo – e pela vez primeira não o achou injusto nem mau [a opressão
capitalista, o trabalho escravo e a tragédia dos imigrantes não lhe tocaram a
imaginação ou a retina].
A mão do
artista de Brodósqui [mão essa exímia em segurar um preciso pincel embebido em óleo]
pela primeira vez acariciou com o pincel a tela, mas não a começar em caras
gretadas, marcas de varizes ou rugas à la cânion. A mão deixou-se levar [talvez
por lembranças de infância ou anúncios de maiô em alguma revista] e [em lugar
das linhas retas do sofrimento] passeou [talvez em delírio] por parábolas e montanhas-russas,
e por três horas [dizem] Cândido Portinari ano soube as horas.
Quando [finalmente]
afastou-se três passos, viu que do óleo e da tela [e pela primeira vez do óleo
e da tela de Portinari] observava-o uma jovem [olhos castanhos e cabelos
surpreendentemente ruivos – os cabelos de todo seu corpo]. Ela o olhava, nem
oferecida e nem pudica, nua e não supreendentemente feliz.
Não se sabe o que Cândido Portinari
pensou de seu primeiro e único encontro com a felicidade. Apenas que a pintura
nunca fez parte dos catálogos de leilão da Galeria Bonino.
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