O Poeta beijou os seios da
sua Musa duas vezes (uma em cada), resistiu à tentação de beijá-los uma
terceira e recolheu-se [em Torre de Marfim na beira do Sena ou em kitchenette
no Flamengo] para escrever sobre.
Procurava o salto da palavra
ao fato – aquele momento [temporal ou de sensação] no qual escrever sobre beijar
equivaleria a beijar – essas massas de sons [que a tradição denomina palavras]
ao enrodilhar-se nessa constelação multiforme que denominamos de sentido se
mostrasse do mesmo nível [ou mesmo melhor] que esse encontro de conjuntos de
matéria a que se deu o nome [um tanto inverossímil] de Realidade.
Descobriu [e se conformou e
surpreendeu com isso] que para se escrever sobre lábios, coxas e gemidos não se
deve viver nenhuma dessas coisas. Para frases sobre a amada eterna ou a
parceira de uma vez só, a primeira e primordial lei é que nenhuma delas deve
estar presente.
Em observância e decepção
afastou-se da amada. Lutou com adjetivos e sufixos, tonicidades e hemistíquios.
Deixou crescer barba, esqueceu que TV existia.
Desistiu, voltou a sua musa
e beijou-lhe os seios por mais duas vezes (uma em cada) e se conformou com que as
palavras voam – mas não tão alto quanto o estar lá e junto.
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