domingo, 6 de março de 2016

Sexagésima-sexta noite – Catulo e a jovem

Dizem [e talvez não digam inteiramente sem razão] que um dia o poeta Catulo [aborrecido com a vida, os fétidos becos de Roma e as ameaças de Júlio César] entrou em um bordel no Trastevere. Pediu um vinho dos mais vagabundos da Etrúria.

Meio garrafão depois o jovem poeta [25 anos] levantou-se e [os marinheiros do Épiro e as rameiras da Bitínia sem lhe dar muita atenção] discursou que a vida não prestava, que os becos de Roma empesteavam o mundo e que Júlio César era um tirano [recitou Meu desejo de agradá-lo, César, é muito pequeno/ e nem quero saber se és branco ou moreno]. E acima de tudo reclamou de Clódia [amor, paixão e vida] que o traía sem traí-lo [Clódia era casada, com outro]. Comparou-a alternadamente ao arco-íris e ao estrume – até que desabou de tanto álcool.

Levantou-se e viu Clódia [ela sorria, entregue e inteira como nunca]. E levou-a aos fundos do bordel e amou com intensidade. Mas não amou Clódia, e sim uma jovem escrava de Tarsis, de cabelos enovelados e uma magreza comovente, que não se incomodou ao ser chamada de Clódia – pois profissionais não se incomodam.

Ao acordar de manhã [o sol nascia na colina Quirinal e César voltava de outra guerra] Catulo procurou a bolsa [vazia de dracmas, por gasto e roubo] e voltou para a domus. Estendeu a folha de papiro egípcio e começou Vivamos, minha querida, e amemos/ e as censuras desses velhos tão severos/ não valham para nós um só centavo – e a posteridade nunca soube que se referia a uma profissional do amor no Trastevere [como aliás, a posteridade nunca sabe de nada].

Um comentário:

  1. Maravilhoso texto!!

    Hoje escrevi, visite-me!
    Abraço- http://prazeresecarinhossexuais.blogspot.pt/?zx=e7c3217bdcc84085

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