- Marcel?
- Oi.
- Muito frias as coisas?
- Estou perto da base russa.
- Ansiosa para o resto da história. A Professora Heloísa, a aluna Isabelle, e qual o problema?
- Lá vai:
- “...e tudo se encaminhava para o momento em que a divorciada e charmosíssima professora Heloísa e a solteiríssima e [quase] inocente vinte-e-poucos aluna Isabelle se encontrariam para um momento de disposição [ou curiosidade] em algum quartinho depois de algum por-do-sol em alguma sexta-feira na qual nenhum das duas tivesse nada mais interessante que roçar os lábios nos bicos da outra.”
- - E?...
- E apareceu no mestrado uma aluna novata chamada Teresa. Bem diversa de Isabelle, Teresa ostentava um cabelão cor asa-de-graúna em contraste com o alourado da outra. Teresa falava três palavras para cada uma que lhe entrava nos ouvidos, ao contrário da discreta Isabelle.
- Quer deixar de embromação e ir logo ao ponto? Quero ouvir histórias de mulher a se lamber. Quero ouvir gritos de ai-que-gostoso-é-muito-melhor-que-com-meu-namorado!
- Isso é jeito de uma sacrossanta mãe falar??
- Sacrossanta a sua vovozinha.
- Então o resto conta você.
- Conto mesmo. Quero ver se não tiro essas três calcinhas em um par de minutos.
- Seis e trinta. Até amanhã.
quarta-feira, 9 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-oitava noite – Heloísa e as pupilas - uma transa a três (III)
segunda-feira, 7 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-sétima noite – Heloísa e as pupilas - uma transa a três (II)
- Gilberte?Um par de minutos.
- Gilberte?
- Oi! Atrasada mas cá estou!
- Como está o filho?
- Quietinho. Dia de sorte hoje. Conta, vai.
- A professora Heloísa e suas alunas?
- Essa mesma. Anseio.
- Lá vai:
“Os olhos de uma certa Professora Heloísa [óculos de
tomar metade do rosto, batom gloss bege, quarenta e poucos anos e um
divórcio no currículo] circularam pela aula no primeiro dia da aula
e bateram em Isabelle. Isabelle: vinte e três anitos, uma matrícula
no mestrado, uma blusa com decote não muito sovina que lhe mostrava
a alcinha do sutiã claroverde, no qual o olhar vagabundo da
professora pousou. [A Professora Heloísa não era politicamente
correta].
Nem politicamente correta nem psicologicamente ingênua:
alguns aninhos de terapia a fizeram concluir que, depois de anos de
joguinhos de algo-a-entrar-em-algo, queria uma variação. Não
queria amor, não queria revolta: queria saber como era. E encontrou
o que queria nas alcinhas do sutiã da recém-aluna Isabelle.
Nos cabelos escuros e lisos de Isabelle encontrou o alvo
ou parque-de-diversões ideal: a garota só foi sua aluna por três
semanas, passando depois da introdução à Universidade o curso para
outro – ótimo pois aí evitava frescurites éticas. Terminara um
namorico e viera do interior morar com uma tia convenientemente
idosa. Perfeito.
A Professora Heloísa começou o cerco de idas a
sorveterias e jogos de boliche, a duas.
Quando tudo parecia que se encaminhava para algum fim de
noite com duas calcinhas uma sobre a outra em um canto de sala
aconteceu algo inesperado...
- O que foi? - perguntou Gilberta.
- Tempo de reparar a escotilha. Continua amanhã.
- Beijos. Ansiosa!
domingo, 6 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-sexta noite – Heloísa e as outras - uma transa a três (I)
- Liberemos?
- Liberemos. Como estão as coisas aí no Polo Sul? (Veja o episódio um).
- Frias. E nem estou no Polo Sul. Estou na banquisa de … ah, deixa pra lá. Como vai seu filho?
- Deixa pra lá. Estamos aqui para conversar ou para contar história de sacanagem?
- A última opção, certo? Que quer que eu conte?
- Uma história mulher-mulher!
- Desejos ou recordações antigas?
- Não é da sua conta, caro navegador do Polo! E então?
- “Era uma vez uma professora universitária chamada Heloísa. E uma aluna de mestrado chamada Isabelle. E outra aluna do mestrado chamada Teresa...
- Eita, logo lés a três! Eheh
- Minha caríssima Gilberte, cujo nome verdadeiro não conheço, que se identifica como uma jovem mulher separada com algum dinheiro e devotada mãe de um garoto deficiente: a questão que se nos coloca é como se vai de uma sala de aula...
- O que é que a tal da professora Heloísa ensina mesmo?
- Que tal astrofísica nuclear? A questão que se nos coloca é como se vai de uma aula de astrofísica nuclear para um quarto com uma cama esverdeada na qual a professora afunda com as orelhas pressionadas pelas coxas bronzeadas-no-Guarujá da sua aluna Isabelle, enquanto com a mão esquerda (ela é canhota) acaricia a macia florestinha clara entre as pernas de sua outra aluna Teresa. Quer ouvir? Está molhadinha?
- Se quero. Está molhadinho?
- A primeira lição que se aprende quando navegador solitário, minha cara Gilberta, é que, por mais que se abrigue, está-se sempre molhado. Então, quer ouvir a história da professora e das duas alunas?
- Se quero! Quatro da manhã. Tenho de dar o remédio dele. Beijocas.
sábado, 5 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-quinta noite – Levar-te-ei a uma Orgia, Melissa Maria
Levar-te-ei a uma orgia [Melissa Maria] e nenhum de nós
é santo. [Poderia ter escrito festa liberal, encontro de gente
moderna, wifesharing, swing ou qualquer neologismo estadunidense mas
preferi o mais claro, o mais óbvio. Pois somos claros, eu e tu,
Melissa Maria].
Tu usarás [durante algum tempo] uma tanga de um suave
vermelho-rosa que eu levarei dois séculos para escolher no catálogo
online, além de um sutiã de renda tão vaporosa que alguns
metafísicos de antigamente poderiam até duvidar que exista.
E não amarás [fisicamente ou de nenhum outra forma]
nenhum além de mim. Isso deixarei mais claro que pedra ao sol
brilhante [talvez para tua discreta decepção, Melissa Maria] pois
não és santa [eu muito menos].
Morenos, brancos, alemães, negros, canhotos – nenhum
deles terá importância [minha cruel Melissa Maria, e eu mais cruel
do que tu]. Não passarão de pedaços de carne [carne viva em um
açougue no qual para ti escolherei os melhores nacos]. Não serão
patinho ou alcatra – serão pedaços mais penetrantes, mas pedaços
de qualquer forma, a serem esquecidos depois do mesmo jeito.
E com os meus olhos comerei os teus olhos [teus olhos
marcadamente castanhos, Melissa Maria] enquanto recebes os presentes
– diferentes mas os quais cuidarei que sejam todos avultados.
Todos [italianos, negros, de olhos verdes ou da Romênia]
serão todos eu, Melissa Maria. Pedaços de carne a serem dados de
presente. E não amarás ninguém além de mim.
sexta-feira, 4 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-quarta noite – Vejo [minha cara] a palavra clara
Vejo [minha cara] a palavra clara,
a palavra que continua com ce, principia com bo e
termina com ta -
a palavra boceta.
[A tua].
E mais que a palavra [clara e cara] vejo a própria
que começa na junção das coxas,
cresce pela curva das ancas,
encontra-se na floresta fechada e negra
e termina a espiar de longe a depressão do umbigo.
Quero [minha clara] a palavra cara,
a palavra multimetaforizada,
a palavra espada,
mastro, torre de Pisa em pé,
ou qualquer metáfora para o simples monossílabo pau.
[o meu]
Imagino [cara e minha e clara]
a cena escura [ou quase]
meu pau a afastar os lábios da tua boceta
sem deslizar de filme porn nem gemidos de virgem.
No tamanho exato, caminho certo, concreto passo.
Almejo [minha e teu e nua, cara clara]
nós dois
[pau e boceta]
bem pequenininhos [depois]
um aninhado no outro
a sonhar com anjos
que também andam pelo Céu sem roupa.
quinta-feira, 3 de novembro de 2016
Centésima-quadragésima-terceira noite – Em algum lugar longe
Imagino um país distante no espaço e no tempo –
algum lugar que soe abstrato e onde qualquer história se torne
verossímil. Imagino [digamos] a Irlanda, em 1916. [Houve uma
revolução nessa mesma época, mas duvido que Sean e Chloe tivessem
ligado para isso].
Sean marinheirava pelo mundo [algum navio da Booth
Line que até beijava as costas do Brasil]; voltava seco e baboso
depois de meses de sal e mar; e passava dos vinte centímetros. Chloe
trabalhava de auxiliar de enfermeira; morava com uma tia surda em uma
ponta de rua; e não era exatamente uma virgem.
E nenhum dos dois era de muita conversa.
Este ritual se passava entre cinquenta e duzentos e
quarenta minutos depois do navio amarrar a primeira de suas cordas na
doca [dependendo do fim do plantão dela].
Sean e Chloe não chegavam a trocar vinte palavras antes
que Sean com suas mãos grandes [pois todo marinheiro tem as mãos
grandes] suspendesse Chloe pela cintura como suspendera fardos de
algodão prensado. Depositava-a sobre a cama de penas e afastava-lhe
as coxas. E se antes não tivesse lembrado, com movimentos
centrípetos reduzia-lhe a calcinha a dois ou três pedaços
rasgados, enquanto Chole [olhos azuis] respirava profundo como o mar.
E o corpo de Chloe [delgado e branco] suportava com
admirável resistência o peso e os golpes do marinheiro, enquanto
lhe percorria as costas com os dedos, a rascunhar desenhos
invisíveis.
E no final, era a enfermeira que queria tris.
sexta-feira, 28 de outubro de 2016
Centésima-quadragésima-segunda noite – Casal sem graça
Os
textos eróticos sempre empurram vinhos chateau
alguma coisa, charutos, de preferência algum iate com um
romanticíssimo glacial suíço pela janela do hotel. Ou então
alguma praia imitando cartão postal de Punta Cana. Junte-se a isso
cintas-ligas, um smocking, muita tranquilidade e desnecessidade de
trabalhar – smocking e cintas inevitavelmente empilhadas em algum
canto no momento H.
Neste
momento decido [minha caríssima leitora e meu caríssimo leitor]
democratizar a vontade de fazer aquilo.
Penso
em um casal sem graça. E o mundo é pleno de casais sem graça. Que
tal um mineiro de carvão nas montanhas da Manchúria e sua esposa
consertadora de tratores? Ou algum caçador nas planícies do
Zimbabwe e sua jovem mulher plantadora de inhames? [E ainda falam em
estereótipos].
Decido
por um lenhador no norte da Rússia e sua esposa que trabalha como
secretária na creche da cooperativa. Natacha tem uns quilos a mais e
uma timidez que até a criançada nota, Ivanov é baixo e penou para
conseguir o diploma passar na escola média. As palavras que trocam
no final da tarde são raras e nelas o tempo e uma outra notícia de
família enchem o buraco do silêncio.
Seguem
ritual, cujo ponto de partida ocorre ao se cobrirem com o cobertor de
penas de ganso da Moldávia. Ivanov não fala nem beija: afasta as
coxas de Natacha [as mãos acostumadas a empurrar toras de pinheiro]
e Natacha finge-se surpresa. Ivanov mergulha inteiro e emerge também,
com delicadeza de motoserra. Natacha dá um par de gritos. Ivanov não
beija, sequer sabe dizer eu-te-amo. Ronca em um prazo máximo de
cinco minutos.
Natacha
ajeita o cabelo como pode e sonha com dois anjinhos a voar. Nunca
entendeu por quê.
quinta-feira, 27 de outubro de 2016
Centésima-quadragésima-primeira noite – Persegui Manoela Teresa
Durante
setecentos e dezessete dias e três horas e meia dúzia de segundos
persegui Manoela Teresa. Trouxe-lhe flores, fui cavalheiro, abri mais
portas que qualquer concierge
do
Hotel Mediterranée, multipliquei bilhetes com versos
tirados do Google e mandei cartões até no aniversário do seu
canário belga, e Manoela
Teresa não ocasionou nenhum clac a desfazer o fecho da
cinta-liga vermelhona.
Levei-a
bares de beira de morro, shows safadões com algum Wesley, puxei-a a
dançar em funks que repetem continuamente as mesmas cinco palavras
[das quais três com erros de ortografia], chamei-a de tchutchuca,
vestia-a com boné de aba para trás, fizemos coreografias diante das
quais Michael Jackson era um clássico em bailes improvisados ao lado
de paredões cercados de isopores com vodca de preço a rastejar ao
chão de tão barata, e Manoela
Teresa me deu beijinhos de boca fechada e me desejou
boa noite ao bocejar.
Pus óculos
parecidos com os de Sartre, comprei edição francesa das Flores da
Mal, contei-lhe a história de Remarque ou das lendas de algum cantão
suíço, discuti com ela a distinção entre Verdade e
Realidade à luz da filosofia analítica, e Manoela
Teresa não me mostrou a coleção de calcinhas.
E então
voltei-me a ir embora, para meditar minhas mágoas em alguma montanha
próxima a Katmandu ou ir para casa.
E Manoela
Teresa me puxou, convenceu-me a contemplar a paisagem
pela sua janela. E contemplei o por do sol fosco sobre o corpo de
Manoela
Teresa, que dava gritinhos.
quarta-feira, 26 de outubro de 2016
Centésima-quadragésima noite – Deita e abre as pernas
- É nessa pequena mesa. Daqui a trezentos segundos
quero vê-la coberta com teus sapatos de salto altura da
estratosfera, os meiões de seda, essa tanga fio-dental rubra que já
entrevi pelo vestido violeta curtíssimo, o vestido violeta
curtíssimo, o sutiã micro que nem precisava, e os brincos como
cereja do bolo. Podes começar.
- Eu obedeço, meu senhor.
Passaram-se duzentos e noventa e sete segundos.
- Empilhaste as roupas direitinho.
- Está bem assim, meu senhor?
- Deita e abra as pernas.
- O máximo que puder, meu senhor?
- O máximo. Arreganha. Faz de conta que é bailarina.
- É satisfatório assim?
- Pega as pontas dos lábios e os afaste.
- Assim, meu senhor?
- Mais. Força.
- Melhor?
- Belo buraco. Profundo. Sou o primeiro?
- Não, meu senhor. Outros já adentraram o mesmo
recinto.
- Imaginei, pela facilidade com que abriu. Sou o
segundo? O sétimo? O décimo-quinto?
- Por favor, meu senhor, não saberei precisar números.
- Punir-te-ei por não me teres esperado.
- És muito dilatado e portentoso, meu senhor. Não o
faças.
- Não terei quaisquer vestígios de dó. Prepara-te.
- Nenhum dos outros era tão aquinhoado pela natureza.
- E agora neste exato momento tomas o teu quinhão
maior.
- Oh, meu senhor, meu senhor.
terça-feira, 25 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-nona noite – Serei Maiakovski, serás Lília
Hoje acordei em dia de
Maiakovski – mãos capazes de arrebanhar três canecas de vodca,
cabelo untado a querer voar em forma de pássaro, coração a
fabricar metáforas. E tu [quem quer que sejas] serás Lília [Lília,
a amante de Maiakovski].
Eu [Maiakovski]
agarrarei tua mão [minha amante Lília] e sairemos pelas ruas – e
transformaremos as ruas de invivíveis lugares como Teresina ou São
Paulo nas Avenidas de Petersburgo [a velha Petersburgo do tempo dos
czares - babalaicas e tavernas onde lúgubres estudantes personagens
de Dostoievski planejavam mudar o mundo sem ter ideia de como].
Passearemos pela
Perspectiva Nevski [panfletos bolcheviques escondidos em nossos
casacos, pois todos os russos têm casaco], e em algum café a mirar
a Fortaleza Petropavlovski [virando o rosto sempre que passar alguma
patrulha da polícia czarista] tu [o rosto encostado na mão com o
rubro dos lábios a rimar com o mesmo das unhas] me mostrarás o
vestido branco, de grandes bolas negras. Tomaremos café brasileiro
com vodca [seremos russos] com os braços dando voltas um no outro.
E [minha caríssima
Lília] em alguma água-furtada [três janelas a mirar o amanhecer no
rio Neva] tu apoiarás o salto da altura da estratosfera em algum
pufe de abeto siberiano, puxarás o vestido [as grandes bolas negras
a se deformar] mostrando-me toda a extensão do meião de seda
encimado em um fecho que desfarás – pois é isso que as amantes
fazem.
E o resto que faremos
[minha cara Lília] não serão poemas de Maiakovski.
segunda-feira, 24 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-oitava noite – Hamlet comeria Ofélia
Em um mundo perfeito Hamlet comeria Ofélia.
O Príncipe Hamlet [convenhamos] é um chute no saco de
joias e tesouros afanados pelo seu excelso pai [sem imaginação
nenhuma também denominado Hamlet]. Um ser rastejante naquele castelo
lúgubre a disparar indiretas que os pobres cortesãos da Dinamarca
só aguentam por ser ele filho da rainha. Isso no mundo de hoje.
Em um mundo perfeito Hamlet prensaria Ofélia em uma das
paredes de pedra do Castelo de Elsinore [preferencialmente uma que
desse para o sol, para a duquesinha não sentir muito frio];
pressionaria com seu joelho entre suas coxas até que ela as
afastasse; seguraria no seu queixo para obrigá-la a mirar na pupila
dos olhos dele [que não seriam indecisos]; esperaria que ela
fechasse os olhos em sinal de entrega e então lhe aplicaria um
desentupidor de pia que talvez provocasse um par de tremores de
terra na Polônia, na Noruega e algum outro reino vizinho.
E terminariam [muito depois] a contemplar juntinhos a
lua nórdica, deitados em rosas, ele a encaracolar no dedo algum
cacho da garota, os dois com muitas poucas sedas nobres a lhe cobrir
o corpo, ou nenhuma.
E não haveria drama, mas ninguém sentiria falta.
domingo, 23 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-sétima noite – Ela, eu, seu corpo e Berlim
Ela [deitada por inteiro de bruços sobre os fofos
cobertores] recitava em duas línguas um velho poema de Hans Magnus
Enzensberger [Nebenan spielt ein Kind Pour Elise/ Por perto um
menino tocava o Pour Elise] – e por [ou não] coincidência ela
também se chamava Elisa.
Elisa deitada por inteiro sobre os fofos cobertores e eu
deitado por inteiro sobre Elisa – Goethe e duas biografias de
Elisabeth da Baviera sobre a prateleira. Moderninhos que somos, o
telão da Internet ligado na livecam nos enchia os olhos com
uma Berlim fosca, o Portão de Brandenburgo calafetado de turistas
que desconheciam que Brandenburgo não é uma pessoa.
Hans Magnus cedeu o passo a um par de estrofes de
Heinrich Heine e Elisa poderia contar as estocadas – de tão
sentidas[Elisa de olhos fechados não via o passeio da câmera pela
Avenida Sob as Tílias [a catedral quase negra como aparição ao
fundo] e eu [talvez levado pelo inevitável romantismo do nome da
rua] apliquei-lhe quatro, seguidas, rápidas, a tentar atingir a alma
de Elisa [ e se não conseguisse, pelo menos que lhe chegassem à
garganta].
Elisa deixou a alta cultura, a cantar alguma baladinha
boba do Luttenberger Klug [Quero atravessar com você esse super
verão] e eu [inspirado ou não pela mudança] também realizei
outra, terminando a visita e começando outra, mas não pela mesma
porta desta mansão, uma doce porta por trás desta mansão
brasileiro-teutônica que é o corpo de Elisa. Elisa me olhou, fechou
os olhos, deu um gritinho a parecer ária de Wagner.
sábado, 22 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-sexta noite – Amar-te-ei em Marte
Amar-te-ei
em Marte [minha cara Tássia alienígena] e seremos [talvez
inevitavelmente e por via de consequência] marcianos. Amar-te-ei
fisicamente [minha esverdeada Tássia] pois Marte não conhece o
fenômeno tão baboso e terrestre do romantismo. E eu desfarei a
trança-ponte no teu cabelo [bem filme trash
de ficção científica], rasgarei de um golpe, de alto a baixo, o
teu macacão prateado [que nem mesmo um convenção de prêmios Nobel
poderia entender por que toda marciana de seriado veste].
E
onde serás mais mulher [ou marciana] tu serás negra, ou loura, ou
púrpura, ou violeta, lilás ou nada [em Marte as cores não
significam muita coisa]. Tu terás bicos de exatos cinco centímetros
de diâmetro [Marte é matemática] com uma tonalidade perfeita entre
o escuro e o rosa, sem esquecer um leve toque de verde [afinal serás
marciana]. Traspassar-te-ei com meu falo de trinta centímetros [ou
três quilômetros] – pois em Marte o espaço é relativo – e nos
amaremos durante duas ou três auroras siderais, que dá algo como
seis ou sete anos [o tempo também o é]. Penetrar-te-ei pela frente
por trás e pelos teus marcianos lábios, tudo ao mesmo tempo [já
disse que em Marte tudo é diferente]. Tu brincarás com minha
semente, que flutuará [a gravidade em Marte não é lá essas
coisas], fazendo-a atingir teu exato umbigo marciano.
E
assim nosso amor físico terminará [em Marte todo amor é físico]
ou continuará em assíntota infinita [pois em Marte, já disse, tudo
é diferente].
sexta-feira, 21 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-quinta noite – Deslizarei minhas mãos
Deslizarei minhas mãos sob as laterais de tua tanga
[Helena Maria] e sentirei a maciez dos pelos louros da tua coxa, além
de outros pelos ainda mais macios. E termos uma idade lá pelo meio,
e o faremos em praia no Sul da Bahia que por raio de cinco
quilômetros e meio não possua outros seres vivos que não alguma
tartaruga verde, arraras e conchas [uma Itacaré no ano 1911 ou
parecida coisa].
Ou estrelaremos em alguma boate em Dresden ou Budapeste
[minha caríssima Helena Maria] e seremos jovens e tatuados, sem
dinheiro e com disposição. E em parte pela necessidade [e em parte
pela adrenalina de o fazermos em frente a estranhos em uma cidade em
que somos menos conhecidos que algum habitante de Saturno] nós
reproduziremos um lua-de-mel a dois, pela frente, quatro e lado.
Ou [deixemos voar a imaginação] nós nos veremos no
próprio Saturno [algum Star Trek fora de época, data estelar
34.8968363.0, o que quer que isso signifique. Terei um falo de três
quilômetros [ficção científica, lembra?]e tu terás seios
desafiarão toda ideia de Perfeito – gozaremos durante três
órbitas, e aterissaremos.
Aterrissaremos onde estamos [Helena Maria] nesse café e
nessa cama, onde nos amaremos como somos.
quinta-feira, 20 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-quarta noite – Nâo sou um anjo
Não sou um anjo apesar de ser Mariângela, e sem nenhum
vestígio de pudor declaro que um dos meus objetivos depois que
completei meus trinta-e-cinquinho era fazer com que Cristino Roberto
deixasse de sê-lo [nome estranho com o apelido boboca de Betinho,
vinte anitos, zero namoradas, carinha de querubim, volume mais que
razoável na sunga negra na qual eu o flagrei na piscina, primo de
amiga de colega, a presa ideal – e eu não sou um tubarão].
Convidei-o para castos sorvetes, partidas de tênis
amador, almoços em self-services bem família. Aos
poucos, e bem aos poucos, a centimetragem das minhas saias foi
diminuindo, assim como a pressão dos panos contra contra as minhas
pernas, cada vez mais apertadas em midi, mini ou micro bermudas e
calças legging. Arrastei-o a uma prainha de leve, eu orgulhosa da
nossa diferença de idade, a fazer os olhos do garoto saltarem com
dois fiozinhos a me substituir as laterais do biquíni.
Uma pane do sistema de
refrigeração do carro salvou tudo. Já estava a pensar que tudo
ficaria nesse low-key
desejinho não-realizado quando debrucei no motor, garagem trancada,
bermudinha de fiapos - e senti a respiração de búfalo. As mãos do
menino coadjuvaram e em breve eu [quase-professora] o ensinava a
nobre arte de explorar o corpo de uma garota de quatro. Isso depois
de dar micro-aulas sobre as artes não menos nobres de vestir a
borracha e deslizar calcinhas até os tornozelos.
E assim transformei
Betinho em não-anjo. Malvada, não?
quarta-feira, 19 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-terceira noite – Serás minha secretária, Carla Teresa
Serás
candidata a minha secretária [Carla Teresa]: cabelo puxado num coque
para trás, óculos tamanho king size,
batom gloss
vermelho-sangue, vestido bem acima do joelho, e um jeitinho ao
encostar os lábios na ponta do lápis, ao ouvir os requisitos do
cobiçado emprego ao qual te candidatas.
Serei
o executivo que te entrevistará [Carla Teresa] – pouco acima dos
trinta, solteiríssimo, terno Armani última geração, bíceps
moldados a academia e uma capacidade de distinguir quem é anjinha e
quem não é – e verá que não és [Carla Teresa] e eu muito
menos.
Na
nossa entrevista [27o andar de algum cubo de vidro em Sampa ou Nova
Iorque] discorrerei sobre a necessidade de saber línguas – e tu, a
morder a ponta do dedo mindinho, concordarás que a língua é muito,
muito importante – enquanto eu vislumbrarei [na tua cruzada de
pernas] que a ansiedade da entrevista te fez esquecer a calcinha.
Direi
que nunca vi melhor candidata e, quando nos aproximarmos para assinar
o contrato [teu Chanel 5 a me encher narinas e vidas] eu
acrescentarei [sério], que o mesmo contrato incluindo o uso regular
de tua vagina pagaria o triplo. E tu [depois de meditar dois
segundos] o aceitarás.
Honesta,
tu me dirás que faz questão de um teste prévio. E testá-la-ei
[Carla Teresa] sobre a mesa de jacarandá – e o esquecimento da
calcinha tornará tudo mais prático.
E
serás contratada, Carla Teresa, minha secretária muito especial, e
eu teu executivo idem.
terça-feira, 18 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-segunda noite – Dos 99 seios da deusa Khali
Dos
noventa e nove seios da deusa Khali eu [que não sou deus] beijei
apenas dois – os dois que seitas heréticas dizem ser os únicos
que existem. Os bicos escuros
[Khali é afinal indiana] me sufocaram os lábios e a visão, e se
tornaram os polos de um universo delimitado em seu início e fim por
ela.
Das
duzentas e quarenta e nove vaginas da deusa Khali eu [que não sou
explorador] penetrei apenas uma – a única que certos tratados de
teologia Vipassana afirmam ser de fato – e nela perdi-me,
encontrei-me e tornei a sair, íntimo e estranho, místico sem
regras.
Dos
quatrocentos e três olhos da deusa Khali dois – os dois que
segundo certas narrativas vedas encantam o mundo - foram suficientes
para encantar-me, jogar-me ao solo das pradarias de Cachemira (ou do
asfalto de São Paulo) e me fazer de fâmulo, cavalo e estopa.
Entrevi seu rosto, orando algum mantra em sânscrito ou indochinês
enquanto eu tentava respirar o ar filtrado pelos seus mui negros
pelos (Khali é afinal indiana].
Dos
doze mil e cinquenta e sete futuros possíveis para a deusa Khali
[que não é deusa] eu [que roço seus pés como se fosse] escolhi
todos, ou três – os únicos três que segundo alfarrábios que só
existem em minha cabeça asseveram ser os relevantes: em um deles
traspassá-la-ei com o falo, amante supremo; noutro, conquista-la-ei
pelo estômago, com iguarias vedas ou ensopados à brasileira; e no
terceiro farei compras no supermercado, limparei o chão da sala com
amônio e aroma de rosas, e a porei para dormir.
segunda-feira, 17 de outubro de 2016
Centésima-trigésima-primeira noite – Eu, Dido, Rainha
Eu,
Dido [Rainha da Líbia] recebi Enéas [que não era Rei de Nada] em
alguma noite entre a primavera do nascimento de Zeus e a comemoração
primaveril do Olimpo [pois nós gregos temos o péssimo ou ótimo
hábito de não medir direito o tempo].
Recebi-o
coberta com finíssimo tecido de seda da Bitínia, e o finíssimo aí
se torna mais que figura de linguagem – a camada única deixava
transparecer o escuro dos suaves bicos – o que lembrava a meus
súditos que uma rainha nada deve, menos ainda explicações.
Enéas
veio como os outros – barba alourada, alto como uma torre, as
chapas de bronze na armadura ao peito a contar batalhas míticas que
nas quais ninguém mais crê. Como os outros – Enéas não é o
primeiro: uma rainha nada deve, menos ainda castidade.
Como
os outros, apenas mais humilde – os dez anos de surra nos morros de
Troia lhe deram lição de não-posso-tudo, bem marcado no seu olhar
de cocker spaniel.
Eu,
Dido [amiga dos deuses] fiz de Enéas [guerreiro desempregado] meu
cavalo [para ser montaria], meu cachorro [para metamorfosear-se
arfante e lambedor] e minha pulga [para grudar na pele e só se
afastar por vontade minha].
Explorei
seus braços e coxas e desviei de todas as suas tentativas de me
envolver em picuinhas de politica grega.
Despachei-o
depois pelas ondas do Mediterrâneo, sabendo ele que não era o
primeiro, nem o segundo, nem mesmo o décimo-nono, e que talvez em
minha cabeça a sua lembranças se misturasse com a dos outros –
pois uma rainha nada deve – menos ainda saudades.
domingo, 16 de outubro de 2016
Centésima-trigésima noite – Recomecemos, Carla Teresa
E
não recomecemos do começo [Carla Teresa], mas por trás - eu por
trás de você, Carla Teresa.
Você
de quatro, uma blusa negra a livrá-la da nudez total – mas não o
suficiente para ocultar o ondular dos seios no movimento – eu
surfista a a aproveitar as vagas de seu corpo.
Recomecemos,
caríssima Carlíssima, e não recomecemos sós. De nosso casto
quarto de amor-a-dois percebermos que temos plateia [algumas amigas,
depois amigos] e isso só nos afagará o ardor. Em nosso delírio
esse punhado se transformará em plateia de teatro, de centenas
[você, eu e uma colchonete ridiculamente azul-choque sobre o palco,
na posição onde ficaria o piano Steinway] nossos
gritos a interpretar uma outra sinfonia.
E
perceberemos [minha tão surpresa Carla Teresa] que nos amamos no
meio de um estádio [a cama grande mas pequena dentro do círculo
central] – estádio cheio, close no seu rosto no telão no início
do segundo gozo e a expectativa do geiser
a disparar delicados jatos de amor na curva das tuas costas.
E
nessa era de reality-shows
faremos o nosso, próprio – nosso amor físico e cármico
distribuir-se-á por satélite para cento e trinta e um ou cento e
trinta e dois milhões [só o Ibope saberá o número exato] – o
que a nós [olhos fechados juntos na tomada da câmera em ângulo de
corte cima-a-baixo] importará menos que duas folhas secas.
Recomecemos,
Carla Teresa, e não recomecemos íntimos – pelo contrário – que
o mundo reconheça que recomeçamos.
terça-feira, 12 de julho de 2016
Centésima-vigésima-nona noite – O poeta e a garota na madrugada
Alexander Blok
passeava na madrugada da Perspectiva Nevski em São Petersburgo. Era julho de 1912,
o mundo lhe parecia banal e coerentemente só banalidades lhe vinham à cabeça: Noite. Lanterna. Rua. Farmácia. E completou
o tolo verso: uma luz estúpida e baça.
O poeta Alexander
chutava latas às duas horas e quarenta e três da manhã de Petersburgo pensando
em o quanto o mundo era tolo quando uma Fräulein
de olhos azuis e cachecol azul [quase em frente à Fortaleza Petroplavlovski] lhe
cruzou o caminho. Ela lhe pediu um verso. Ele [em um maço de cigarros feitos em
Lübeck] lhe escreveu Ainda que vivas outra
vida, Tudo é igual e não há saída. A garota [dizem] lhe deu um beijo [quase]
inocente.
O simbolista
Blok [cabelos crespos e gravata borboleta negra] seguiu a jovem até uma taberna
nas catacumbas [o sol já se esgueirava por detrás do Hermitage]. Pediu um par de vodcas – não as tomou. Gritou que o
sonolento dono e os outros fregueses saíssem, atirou-lhes um rolo de rublos e pôs
a tranca no portão.
A garota do maior
poeta daqueles tempos de quase-revolução puxou-o pela gravata borboleta, agarrou-o
pelos cabelos, o poeta levantou-a pelas coxas e pousou-a na mesa odorosa de
resina e álcool. E se beberam, lamberam e impregnaram um do outro até que [sol
alto] o Regimento da cavalaria de Guarda do Czar marchou em frente quebrando
qualquer encanto.
Anos depois,
o poeta simbolista russo Alexander Blok lembrou da garota e pensou que tudo era
mesmo banal, menos um momento como aquele – e decidiu nunca mais escrever.
quarta-feira, 6 de julho de 2016
Centésima-vigésima-oitava noite – Treppamos, nós dois e Berlim
Liebe Frieda, du hast mir doch gesagt – você me disse, querida Frieda – só
que você não disse nada e nem se chamava Frieda, e nem eu Hans ou Gunther. Em vez
disso você me cravou os olhos azuis [que não são azuis – não somos germânicos] e
baixou a cabeça, sua doce cabeça muito
maior que a minha, que engoliu. [Em nossa volta o quarto de hotel de ridículo
rosa, e na noite fria da Keithstrasse, a rua Keith de Berlim, pouquíssimas
luzes dos predinhos na outra calçada].
Nem um pouco
germânicos, não éramos Tristão nem Isolda, e os cavalos dos heróis do Valhala pouco
se comparavam a os trens da U-Bahn, o
metrô que pegávamos de dia – nossos ouvidos entupidos com a voz metálico-computadorizada:
próxima estação – Bülowstrasse... Gleisdreieck...
Wittenbergplatz... – e eu mascava, sugava e engolia com meus olhos o seu
corpo escondido por camadas de roupas – roupas excessivas para aturar os cinco
graus que me faziam ter saudades dos Trópicos.
E eu descontava
com juros ins Bett, na cama onde eu lhe
prensava – fazendo de você um recheio de sanduíche – onde eu era uma das fatias
de pão e o fofíssimo edredom fabricado em algum fim de mundo na Áustria era
outro. Eu lhe tapava a boca para que você
não acordasse os fantasmas dos designers da Bauhaus,
que repousavam na glória dos gênios em um museu lá perto.
E treppamos,
minha cara falsa-Frieda, de mim, seu falso-Hans, pois você descobriu [no meu dicionário]
a palavra mais bela em alemão, Treppe,
escada – e você me disse enquanto mordia um currywurst
em um bistrô na Potsdamerplatz –
eu a querer morder seu pescoço.
terça-feira, 5 de julho de 2016
Centésima-vigésima-sétima noite – Nova História de Fadas
E foram felizes para sempre – e as histórias de fada terminam
sempre dessa forma, ninguém sabe dizer o porquê [ou talvez saibam]. O Príncipe
se casa com a Princesa – e fim.
Tenho uma
ideia – talvez muitas, e nem sempre melhores: o Príncipe e a Princesa
casaram-se [ou não] ...
...E o
Príncipe suspendeu a Princesa pelas pernas [e lhe mostrou um calibre 19 pronto a
soltar fogo]. Pedaços da calcinha da princesa caíram pelo azulejo quadriculado
do palácio em extraordinário ritmo na medida em que o Príncipe os rasgava.
A cama enorme
que fazia ondas [pois todo palácio que se preza tem ao centro um quarto com uma
cama enorme que faz ondas] não as fez, porém vagalhões – quando o Príncipe jogou
a Princesa sobre o colchão de seda – pois toda cama de Princesa tem o colchão
de seda.
Meia dúzia
de travões principescos e o rapaz desabava.
Menos previsível é a segunda parte: a garota
[pois toda princesa é jovenzinha] jogou-se entre as coxas do marido e com sua
boca de lábios de rubi [como toda Princesa] o fez reviver os bons momentos de
cinco minutos antes. E a Princesa imitou os cavalinhos das reais cavalariças –
e se pôs de quatro – e o Príncipe desafiado se dispôs a cavaleiro, um cavaleiro
quase horizontou, com as mãos dela levando as dele a apertar-lhe os seios. E às
vésperas do gêiser de amor ela colocou
seu rostinho principesco no ponto exato e lhe lembrou as neves europeias a lhe
caírem no rosto. E essa história de fadas me parece bem mais interessante.
segunda-feira, 4 de julho de 2016
Centésima-vigésima-sexta noite – Vulgares, minha deliciosíssima Tássia
Seremos vulgares
[minha caríssima Tássia], vulgares na vulgar quintessência da vulgaridade. Não
existirão [minha dulcíssima Tássia] bailes funk,
forró eletrônico, música brega-techno mais rasteiros que aqueles que eu te
levarei – sem deixar de mascar chicletes baratos, usar boné para trás e calças
jeans apertadíssimas com enfeites de metal sem dispensar um cantinho de ferrugem.
E em todos os anais da Humanidade não se registrará um chevette amarelo-dourado
mais faiscante que aquele com o qual te levarei.
Nem os filósofos
mais renitentes [minha preciosíssima Tássia], em suas exaustivas enumerações do
ser, jamais cogitarão de tops mais apertados
que aqueles que usarás {a forçar o silicone dosagem-jumbo dos seios em bolas a
saltar] nem de bermudas de tecido quadriculado mais barato a marcar as bordas
da sua tanguinha rosa-esfarelada de três réis a dúzia.
E vulgares
os dois [minha aventureiríssima Tássia] entupir-nos-emos de caipirinha custo-lá-em-baixo
[limões comprados no atacadão] e de música a destruir tímpanos, e nos chacoalharemos
em baile a duas moedas a entrada.
E lá pelas seis
[minha notívaga Tássia] puxar-te-ei para o banco traseiro do carraço e lá tu cantarás
sinfonia de palavrões – reclamarás do tamanho, da rigidez, da firmeza, dirás que
os 17 ou 57 anteriores não chegavam à metade, irás me insultar e pedir mais.
E nos
abraçaremos [minha queridíssima Tássia] um abraço vulgar como só amantes como nós
sabem fazer.
domingo, 19 de junho de 2016
Centésima-vigésima-quinta noite – A carta erótica
No dia 19 de
junho de 1938 [exatamente às vinte e três horas e cinquenta e sete minutos] Erich
Maria Remarque tomou da caneta-tinteiro Parker 17, quatorze folhas de papel de
carta impressas com seu monograma e escreveu uma carta para Marlene Dietrich.
[Que ninguém
se preocupe com problemas de orçamento – depois de vender um milhão de
exemplares de Nada de Novo na Frente
Ocidental, o escritor não tinha problemas de orçamento].
Esqueceu as
bombas e os ataques de gás – e não foi nenhum deles que o acordou naquela
tépida praia na República Dominicana. Por aquela noite, os nazistas que o
perseguiam e queimaram seus livros deixaram de existir. O veterano de guerra ]e
denunciador dos horrores da mesma] voltou-se [pela vez primeira e talvez única]
para a bela [e talvez única] realidade da vida – voltou-se para o Amor.
E
encontrou-o em sua conterrânea Marlene Dietrich – um amor anguloso, duro, o
oposto da melosidade hollywoodiana.
E [ele mesmo
re-tornado adolescente] escreveu [com a escrita crua e detalhada que o fez rico
e famoso] o que intencionava fazer com ela – desde as investidas em que sua
cabeça pareceria atravessar-lhe o útero e reaparecer pela garganta, até a
posição em que ele procuraria novos caminhos por dentro dela [ela de costas a
dar gritos de partir cristais] até o encerramento com muito mel – um mel alvo
que a alimentaria com gozo.
Escreveu – e
guardou na gaveta. Tomou outro maço de papéis e rabiscou alguma banalidade
sobre como tinha saudades dela, e esta colocou no correio.
De alguma
forma a carta sincera apareceu na primeira edição da coletânea de cartas entre
eles (edições Kiwi, Colônia, 2003), e depois foi retirada.
sábado, 18 de junho de 2016
Centésima-vigésima-quarta noite – O poeta e a garota
Dizem que Kurt
Tucholsky depois de publicar o Frauen von
Freunden [no qual não sem crueldade desancou as esposas de seus amigos]
arrependeu-se. Pegou o chapéu no vestíbulo do jornal onde trabalhava – a Cortina do Mundo / Die Weltbühne –
trocou duas palavras como o novato Bertolt Brecht e saiu à rua. [O céu de
Berlim porejava uma neblina fina].
O poeta
desceu a Postdamer Platz [era meia-noite e três minutos e ninguém sabe quem
anotou a hora com tamanha precisão], dobrou à direita na Kudamm e se deixou
ficar em um café [dos inumeráveis cafés existentes naquele 1925] na Stauffenbergstrasse [que ainda não tinha
esse nome], pediu um brasilianischen Kaffee com uma gota de leite [sacrilegamente
para um alemão] e se deixou viver. Esqueceu Goethe e a Política, as lembranças de guerra e a eterna briga com o KPD
[o partido comunista].
Sentou-se à
sua mesa não uma Fräulein [naquela
noite quase dadaísta não havia senhoritas louras] mas uma morena [quase como o
café]. Os registros guardaram da garota [se é que existiu mesmo] as
sobrancelhas, o sorriso e o olhar [que, para o poeta, parecia dissipar a neblina].
Do resto da
noite só restaram especulações – de calcinhas baixadas até os tornozelos, saias
e camisas aterrissando em pontas de cadeiras e do poeta e de sua namorada a comporem
juntos [a entremear gemidos e gritos] um novo soneto que menores de idade jamais
poderiam ler.
O resto dos registros
se perdeu em algum bombardeio na Segunda Guerra Mundial.
sexta-feira, 17 de junho de 2016
Centésima-vigésima-terceira noite – Amemo-nos como o poeta
Ama-me
[Gisele Maria] à maneira do poeta cummings: a ação pensada previamente, a saia
com centimetragem medida e pequena, jogada para cima em movimento elíptico que
revelaria a tanga de puro vermelho a se afundar entre as doces bochechas
negras.
E eu te amarei [Gisele Maria] do jeito do poeta cummings – preciso,
metálico. Cada estocada visará o âmago da tua alma [Gisele Maria] – cada estocada
sentida, as úmidas paredes do teu interior acariciadas polegada após polegada
pelo instrumento certo – o qual terás a impressão [Gisele Maria] de te
atravessar por inteiro, ventre até a boca, sem qualquer conhecimento da palavra
compaixão.
E Nós nos
amaremos [Gisele Maria] como sonhou o poeta cummings, ou melhor [e como ele
também sonhou] não nos amaremos. [A Expressão fazer amor para nós não passará de metáfora para virgens]. Nós nos interpenetraremos,
no mais preciso sentido de termo – teus bicos já afundados em minha boca, tuas
coxas a amassar minhas delicadas e másculas esferas. [Pois para nós (Gisele
Maria) cada contração no auge vale mais que duzentos e noventa e nove versos apaixonados].
E tu sentirás
o meu gosto [Gisele Maria] e eu sentirei o teu – e como o poeta cummings, pouco
falaremos, muito faremos e no final pintarei uma aquarela em cor branca em tuas
costas morenas [Gisele Maria], à maneira do poeta cummings, pois com ele
aprendemos [eu e tu] que poesia e pintura caminham juntas, e ambas valem mais
que qualquer declaração de amor.
quinta-feira, 16 de junho de 2016
Centésima-vigésima-segunda noite – Concerto de Violino
Tássia tocou
violino para mim vestindo apenas algumas gotas de Chanel 5 em uma dessas tépidas
noites de junho de dois mil e sempre. [Eu como única plateia, um facho de luz
no teto direto sobre seus longos cabelos negros como única iluminação]. Sua mão
esquerda segurava suave o Mendini de
puro pinho e com a outra deslizava o arco como se não ele, mas o próprio mundo
estivesse em movimento.
Solfejou pela
Partita n. 2 de Johann Sebastian Bach
e a bamboleante melancolia setecentista fez conjunto em perfeição com os acordes
do corpo de Tássia – as coxas grossas a culminar nos quadris curvilíneos que afinavam
na cintura – Tássia toda em curvas, mais que toda mulher. Seguiu o Capricho n. 1
de Paganini e o nome da canção se coerentizava com os seus caprichos próprios –
desde as unhas cobertas de suave vermelho até as pontas do cabelo, em curva absolutamente
insólita, existente apenas pela beleza em si.
Como muitas
plateias tive o pensamento de jogar-me a seus pés e como nenhuma plateia fiz isso.
Beijei-lhe os pés [ela no Concerto em Sol Maior n. 3 de Mozart] e depois os
tornozelos, e os joelhos, e quando chegava ao clímax da obra do Mestre de Salzburgo
eu me perdia – não no labirinto da grande arte mas nas trevas entre suas coxas.
Tássia tocou
violino para mim e [olhos fechados e respiração a pesar] conseguiu não perder nenhuma
nota – para mim, que a aplaudi com beijos fundos, cada vez mais.
quarta-feira, 15 de junho de 2016
Centésima-vigésima-primeira noite – Aos que se amam como corpos
Nós
nos amaremos [Ana Manoela] [e corajosos como somos] em um colchão de plástico, em
meio a um ginásio, colocado no meio da quadra de vôlei, com uma arquibancada
grande de entrar no Guiness – e vazia.
Imagino a
você e imagino a mim [Ana Manoela] neste campo ideal, de amor e de batalha.
[Pois você é forte (Ana Manoela) como as proposições de Wittgenstein e os socos
de Cassius Clay/Muhammad Ali] – e camas maciíssimas cobertas com colchões cor
de rosa e laços de fita ocultas atrás de portas trancadas a dezessete chaves não
combinam [Ana Manoela] com nosso modo de amar. [Amar fisicamente (Ana Manoela) pois
não concebemos outra foram de amor que não envolva braços e coxas].
Você pulará
sobre mim e me trancará com chave de pernas, e eu chuparei alternadamente um e
outro de seus seios a fazer com que vertam o leite que sempre desejei, seios
esses que você em contra-ataque apertará um contra o outro a me sufocar a
respiração. Colocá-la-ei de costas para visitá-la da forma selvagem e doce que
sempre quis e você me apertará as orelhas com suas coxas – e suaves pelos negros
filtrarão o meu olhar, a ver teun rosto a quilômetros lá em cima.
E gritaremos
[Ana Manoela] como gatos ou lutadores, e a plateia [essa doce plateia inexistente]
aplaudirá nossa performance – um aplauso carinhoso e inútil – dispensável aos
que se amam como corpos, como nós.
terça-feira, 7 de junho de 2016
Centésima-vigésima noite - Matemática erótica
Muito além das
somas e das estatísticas, quero [com lentidão assintótica e sem precisara de calculadoras]
colocá-la na posição exata, não da equação, mas da mesa [uma mesa suficientemente
forte para aguentar o seu peso e os impactos que pretendo aplicar a esquecer
toda delicadeza]. Minhas mãos ao levantarem sua muito minúscula saia verde revelarão
a curva perfeita e macia, guarnecida de suaves e claros pelos que sentirei ao irromper-lhes
uma mordidela de lábios, depois de dentes [Ana Manoela] enquanto você fecha os
olhos em busca do Nirvana ou qualquer
semelhança.
E curvas [Ana
Manoela] não faltam no seu corpo – proposição cuja veracidade atestarei ao
estreitar minhas mãos na tua cintura e subi-las [afastando-as aos poucos e afastando
por igual qualquer blusa, seu sutiã há muito beijando o tapete] e encontrar duas
parábolas [que se parábolas realmente fossem teriam coeficientes perfeitos] –encimados
por rosadas cerejas [de bolo, ou de equações integrais] as quais beliscarei ao
puxar leve enquanto você sussurra algum teorema de Pitágoras do qual nenhum de
nós dois se lembra.
Toda essa
riqueza em curvas [Ana Manoela] terá contraste quando eu [reto, em ângulo reto
contra duas contra suas coxas abertas a sessenta graus] fizer uma adição, um
mais um igual não a dois, mas a um só com olhos para o céu e pedaços de palavras.
E na nossa matemática, essa conta será exata.
segunda-feira, 6 de junho de 2016
Centésima-décima-nona noite – Não pesarão em mim, Tássia
Não pesarão
em mim [Tássia] os domingos às dezenove horas e vinte minutos em que não te
coloquei de quatro em uma mesa forte e baixei tua tanga até os tornozelos. Nem
aquelas seis da manhã em que acordaste com um Zeppelin suspenso a um par de
centímetros de tua boca, a mesma boca que o faria desaparecer.
Não pesarão
em mim [caríssima Tássia] as praias de finíssima e branca areia [desertas ma non troppo] em que de repente a sua
microtanga comprada na Internet se me parecerá enorme, gigântica, do tamanho de
Paris, e eu a deslizarei por suas coxas e, coerente, despir-me-ei de qualquer
vaidade e pano, e correrei atrás de ti – tu a dares gritinhos.
Não pesarão
em mim [destemida Tássia] os momentos de indecisão em que [eu a vislumbrar com
sobeja clareza o limite da sua marca de bronze] entrarei [visitante de honra]
em um dos caminhos que levam a teu ser, e depois entrarei pelo outro, e depois
voltarei ao primeiro, e depois experimentarei do novo o segundo [nós dois a
olharmos na mesma direção], tu de olhos fechados a recitar sonetos ininteligíveis.
Não pesarão
em mim [preclara Tássia] nada que não farei contigo, nem gritos, nem dores, nem
molas quebradas de camas e carros.
Não pesarão em
mim [querida Tássia] pois farei de tudo isso um pouco, e demais.
sábado, 4 de junho de 2016
Centésima-décima-oitava noite – Marirejane e Kerginaldo
- Por favor, Kerginaldo, não deslize
sua mão debaixo na minha blusa, Kerginaldo, por favor. Nenhum homem jamais
tocou nos meus seios antes. Eu gosto de você, mas não pensei que as coisas
chegassem a esse ponto. Quando você me convidou para ficarmos um pouquinho
atrás da igreja, eu pensei que era só para ver as estrelas. Não desabotoe minha
blusa, Kerginaldo. Não baixe o meu sutiã, por favor. Não me faça deixar de ser
pura, Kerginaldo. Não me faça deixar de ser inocente.
- O que é isso, Kerginaldo. Eu nunca
vi isso antes. E é tão longo. Aí não, Kerginaldo, por favor. Não ponha sua mão nesse
lugar. Por favor, Kerginaldo, eu quero entregar o selo da minha pureza como
presente para meu futuro marido na noite de núpcias. Não levante minha saia,
Kerginaldo. Achei que você só queria tomar ar comigo na noite. Não deslize
minha calcinha pelas minhas coxas, Kerginaldo. Pensei que só o meu futuro esposo
que faria essas coisas.
- Não meta na minha florzinha,
Kerginaldo, por favor. Não meta, não meta. É muito grosso e grande, Kerginaldo,
e não tenho certeza se vai caber. Você está me fazendo viver os últimos
momentos de minha inocência, Kerginaldo, meus últimos instantes como moça
direita.
- Ai, entrou a cabeça, e me disseram
que agora o resto vai fácil. Não sou mais pura, Kerginaldo, não sou mais
inocente. Agora sou uma safadinha, Kerginaldo, uma putinha. Agora vou me comportar
como danada. Mete nessa boceta, cachorro, manda ver, fode, quero ver para que
essa pica vale, senão troco por outra.
sexta-feira, 3 de junho de 2016
Centésima-décima-sétima noite – Serei sua
Serei sua prostituta, Antônio Marlos
– e você será meu cliente - a profissional, garota de programa, cacho, gata de
praia, nada-a-mais. Pendurarei brincos enormes – aquelas argolas de ouro falso
que roçam no ombro das atrizes de terceira nos pornôs de quarta categoria. Percorrerei
sex-shops de fundo de galeria e lojas
de lingerie em eterna liquidação na Saara
e encontrarei as tanguinhas menores, estampa-de-oncinha, as mais vulgares,
sutiãs-com-furinho, de tecido tão fraco de rasgar a qualquer puxada.
Tatuarei dragões, gatinhos ou
corações flechados, Antônio Marlos, e os desenhos sequer serão originais. Pintarei
o cabelo de dourado-imitação-radical no salão mais barateiro, e uma nota de
três dólares em forma de estrela parecerá mais real que essa cor.
Mascarei chicletes, Antônio Marlos, e
farei pop com uma bola na sua cara, e pintarei os lábios de um vermelho a
enxergar do outro lado do Atlântico. Pegarei bronze artificial e clarearei os
pelos das pernas e apertarei tudo em um top e uma microssaia tão justas,
Antônio Marlos, que cada saliência da pele aparecerá muito mais do que ao
natural.
Falarei palavrões, Antônio Marlos, e
bem perto de você para que possa sentir meu Chanel 5 falsificado. Cobrarei um
preço não muito alto e ainda aceitarei na hora sua contraoferta dois terços
mais baixa. Levá-lo-ei a um motel de esquina e começarei conversa repleta de
safadezas, até que você se impaciente e tome posse de sua mercadoria, que serei
eu.
Serei sua prostituta, Antônio Marlos,
e você será meu cliente.
quinta-feira, 2 de junho de 2016
Centésima-décima-sexta noite - Cinderela
- Gosta de carros grandes?
- Depende do que se faz dentro deles
– e faz mover as ondas do cabelo.
Vaporoso vestido de seda preta,
cabelo de anúncio de xampu, salto do sapato com a altura da estratosfera. Ele
de smoking, brilho no olhar e na abotoadura dourada, jeito de príncipe. Meia
dúzia de minutos de conversa, encontro casual, casualíssimo. Ele pergunta, ela
responde, ele treme leve, o olho dela diz Why not?
Minutos depois o grande automóvel para
em tranquilo-lugar. Banco traseiro prêmio de maciez. Brinco guardado na bolsa,
meia e muito mais no chão, ela envia um dos tornozelos espiar pelo lado de fora
da janela, afasta o outro para o lado oposto, muito longe. A seda negra do
vestido arregaçada até o umbigo traz à visão uma outra seda, muito negra, muito
úmida. Brilhantes pela tensão e pela borracha os centímetros do rapaz
desaparecem um após o outro, o portal negro a devorá-los em silêncio.
Ela dá grito fino de agulha, ele não
sente dor mas geme. Rápida, a mão dela lhe arranca o plástico, a semente cálida
lhe acaricia até o cordão do pescoço.
Voltam metade de hora depois. Ela
ajeita o cabelo, mesmo sorriso. Arranca um dos sapatos, deixa no banco.
Ela já a cinco passos, a misturar-se
à cidade. Ele pergunta Qual é seu nome?
Ela mal se volta:
- Cinderela.
quarta-feira, 1 de junho de 2016
Centésima-décima-quinta noite - Ariadne e Teseu
Ariadne tomou
na mão de Teseu e o puxou para um cantinho escuro. Para um tantão deles – o Palácio
com o estranhíssimo nome de Cnossos possuía dezenas de corredores, centenas de
aposentos e milhares de portas. Tinha uma lógica, na verdade – como todo palácio
real precisava de linhas de distribuição claras para que os soldados pudessem
esmagar o populacho na hora das [raras porém previsíveis] revoltas.
Apesar disso
[ou por causa de] Ariadne puxou Teseu para o 99º [ou o 736º] quarto [ninguém se
deu ao trabalho de contar direito]. E [iluminados por uma janela do mais puro
vidro púrpura da Fenícia] a jovem [não era semideusa nem gozava de qualquer
privilégio do Olimpo] levantou a branquíssima túnica de linho a assentou-se no
seu trono – e ao assentar-se olhou para os céus e elevou um grito – talvez para
Zeus.
Teseu se fez
de trono. Um trono estático, firme, disposto a conter qualquer possível escorregão
ou queda lateral da sua utilizadora. A qual começou por indecidir-se – às vezes
se levantava no trono, às vezes afundava-se no próprio. Passaram a fazer o ritual
mais frequentemente que as cerimônias de Delfos e a partir daí as histórias se
dividem, sendo que as hegemônicas afirmam que os deuses, abismados com a ousadia
dos mortais, decidiram promovê-los à intermediária categoria semideusina.
Quanto ao Minotauro
– esta lenda ter-se-ia originado de outra ideia de Ariadne, que um dia tomou da
mão de Teseu e também a de um guapo rapaz moreno, que depois gerou história bem
diversa. Mas quanto a isso não há consenso.
terça-feira, 31 de maio de 2016
Centésima-décima-quarta noite - Não mais santos, Júlia Carolina
Somos corretos
e dignos [Júlia Carolina] mas em meu sonho não o seremos mais. Aventureiros e
jovens, chegaremos a cidade estranha de terra vagamente liberal [que tal Praga,
ou melhor ainda Budapeste] e lá a falta de vil metal e o desejo de aventuras
nos puxarão para uma dessas boates da pesada. Bom casalzinho que somos, a proposta
será pura, quase inocente – só nos dois [monogamia total] fazendo de tudo
defronte à plateia.
Diante de luzes
faiscantes estroboscópicas e rock mais
que pauleira eu te porei de quatro [Júlia Carolina], você vestindo um par de
brincos de argolona para enfatizar o balanço do corpo, e mais nada. Eu sem ser
espadachim porém já em guarda desaparecerei
uma parte do meu corpo no teu – e indeciso, mudarei de ideia e sairei, para um
décimo depois visitar-te de novo, e depois sair, enquanto tu gritas uma ópera com
letras que só tu entenderás.
E não teremos
vergonhas ou vilezas [Júlia Carolina] e a quantidade da plateia (cem? Duzentos?
Novecentos e noventa?) para nós não passará de mero número [seu barulho só um
fundo sonoro, sua imagem sufocada pelos refletores amarelos]. E eu [em um palco
em alguma distante e liberal cidade] tirarei de ti todas as virgindades que algum
dia nem imaginaste ter, e, cercados de gente, estaremos sós [Júlia Carolina], na
solidão que [no fundo] sempre cerca os amantes.
segunda-feira, 30 de maio de 2016
Centésima-décima-terceira noite - Amante de Salomão
Salomão [o Rei] teve setecentas esposas e trezentas
concubinas – isso o Mundo sabe desde o Livro dos Reis. Tais números geram [quase
e sempre] sorrisos e uma pergunta que não fica no ar, é bem repetida: Como dava ele conta??... E mais sorrisos
se multiplicam.
Essa pequena crônica não se prende a considerações
potencialmente viagrísticas. Realizo outra pergunta, sempre deixada de lado porém
muito mais capciosa: do ponto de vista desta pequena [e na verdade não tanto] multidão,
Como Aparecer no Meio das Outras??
Professores da Universidade de Esmirna-V [trabalhando em pequeno
laboratório da sua congênere em Abu Dhabi] descobriram dois velhos alfarrábios nas
areias do Nilo que revelaram certa Sarah, sempre a primeira escolhida nas noites
de amor do poderoso Rei. Não a mais loura, nem a mais morena, nem a mais alta,
nem a mais magra. Bela, mas havia outras mais.
A jovem Sarah sabia se vestir [mas não o fazia excessivamente]:
laminava o momento exato de afastar a seda do Pamir e mostrar uma meia lua do
bico, ou a maneira exata de em fração de segundos afastar as coxas para sugerir
a Sua Majestade que para ele as afastaria ao triplo. Suas conversas envolviam textos
antigos e diálogos de Filósofos liceanos, e de vez em quando uma doce palavra feia,
para mostrar que era cérebro e corpo – e o Rei a preferia, para o leito e para
dar joias.
Os tais professores [em epílogo bem pouco científico]
dividiram-se em considerá-la heroína ou espertalhona [enquanto creio em intermédio].
domingo, 29 de maio de 2016
Centésima-décima-segunda noite - Amantes Moderníssimos seremos
Amantes modernos
[Vládia Teresa] modernaremos para valer. Seremos arroz de festa [Vládia Teresa]
umas festas muito animadas com amigos para lá de especiais, nas quais metade se
classificará não só pela simpatia e boa vontade mas pela centimetragem. E eu
deslizarei a microtanga de seda verde-transparente por suas coxas e lhe
oferecerei, posição de doce quatrinho. E a festa começará para nós dois – para mim
uma suave e dolorosa festa de mirar teu rosto a franzir os olhos e comparar-me
com os presentes que lhe darei – cada presente plastificado e longo.
Quanto a mim,
serei cavalinho para senhoras casadas entediadas, com seus maridos a observar a
cavalgada, sempre a subir e descer, e sair na H hora e ser por outra substituída.
Serei garçom muito especial entre vários, todos empenhados em servir com o
melhor de seus dotes a uma dama em êxtase. E com o canto do olho verei você a
conversar com uma amiga, e depois com outra, e até uma terceira [Vládia Teresa]
– amigas muito especiais em conversas especialíssimas, com seu rosto a procurar
a profundidade entre as coxas da outra [Vládia Teresa] enquanto a [muito amiga]
faz o mesmo com você.
E depois
disso [depois] vou lhe levar para casa [para a nossa casa] e esquentarei três
dedos de leite com um par de biscoitos, vou lhe abraçar e dormiremos juntinhos
e a ouvir a Berceuse de Brahms e sonhar
com uma nova festa.
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